Em menos de um minuto, o produtor que por décadas atuou como manda-chuvas da Rede Globo jogou por água o esforço de mais de 22 anos da emissora para minimizar o apoio (para muitos descarado) para a eleição de Fernando Collor de Mello como presidente em 1989.
Em entrevista à GloboNews, canal pago da emissora, José Bonifácio
Sobrinho admitiu que, durante os debates da campanha presidencial
transmitidos pela Globo, tentou ajudar o candidato alagoano nos famosos
embates contra Luiz Inácio Lula da Silva.
A declaração provocou reação do ex-presidente e hoje senador – que,
segundo, Boni mandou a assessoria procurar os executivos da Globo para
ajuda-lo na ocasião.
“O Miguel Pires Gonçalves (então superintendente executivo da Rede
Globo), pediu que eu desse alguns palpites, e achei que a briga com o
Lula estava desigual porque o Lula era o povo, e o Collor era a
autoridade. Então conseguimos tirar a gravata do Collor, botar um pouco
de suor com glicerinazinha, e colocamos pastas que estavam ali com
supostas denúncias contra o Lula, mas as pastas estavam vazias, com
papéis em branco”, relatou Boni na entrevista.
“Foi um jeito de melhorar a postura do Collor junto ao telespectador
para ficar em pé de igualdade com a popularidade do Lula”, admitiu o
ex-executivo. “O conteúdo era do Collor mesmo. A parte formal nós é que
fizemos. Me lembrei do Jânio (Quadros), e só não botei uma caspazinha no
Collor porque ele não aceitou”.
Ao reagir às declarações, em declarações publicadas na Folha de
S.Paulo, Collor acabou implicando ainda mais a emissora. Disse que
jamais pediu para alguém falar com o Boni porque, segundo ele, seu
contato “era direto com o doutor Roberto (Martinho, fundador da
emissora)”.
O ex-presidente, que se saiu vitorioso na campanha, também negou que
tenha tirado as gravatas no debate. Ele disse também que o ex-executivo
de “uma viajada na maionese” ao dizer que usou glicerina para simular
suor e que as pastas citadas estacam “cheias de papéis, números da
economia, que sequer utilizei”.
Ao se manifestar sobre a polêmica, o diretor da Central Globo de
Jornalismo, Ali Kamel, disse à Folha que “a afirmação de Boni só pode
surpreender a quem não acompanha de perto a história da Globo”.
Na entrevista, o executivo reafirmou uma declaração anterior, segundo
a qual o ex-presidente Lula dá de dez a zero no Chacrinha como
comunicador e justificou: “O Chacrinha tinha comunicação espontânea, mas
uma técnica profissional. E o Lula não tem essa técnica, é ainda mais
natural. O Chacrinha conseguiu audiência de 30 milhões de pessoas, e o
Lula conseguiu a audiência do Brasil inteiro”.
Boni, que lança agora o “O Livro do Boni” (Casa da Palavra), em que
conta sua trajetória, comentou ainda o período de acirramento da
ditadura militar, época em que o conteúdo da emissora era alvo de
censura.
Mais de 40 anos após o episódio, ele disse acreditar que
agentes da Operação Bandeirantes, criada para combater movimentos de
esquerda durante o regime, estava por trás dos três incêndios ocorridos
nas tevês Globo, Bandeirantes e Record num intervalo de cinco dias em
junho de 1969, numa suposta tentativa de colocar os meios de comunicação
contra os militantes de esquerda no Brasil.
Nem era preciso, de acordo com o executivo, já que as emissoras
estavam lá justamente para manipular informações sobre esses grupos.
“Todos nós, das emissoras, nos armamos contra o pessoal de esquerda, num
primeiro momento. Fizemos textos para colocar no ar (dizendo): ‘quem
destrói o que é do povo, é contra o povo’. Imaginávamos que haveria um
ataque terrorista de esquerda.”
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